CONCÓRDIA - ADRIANO SIQUEIRA / ERIC NOVELLO
Dalton era um rapaz muito curioso. Tinha 22 anos, era Loiro, alto e seus olhos eram azuis. Ele sempre se envolvia com todos os tipos de pessoas e problemas. Para ele, nada importava mais do que conhecer o mundo por completo. E naquela noite ele iria conhecer algo que mudaria a sua vida para sempre.
Dalton estava acompanhado de seus dois amigos, Carlos e Mauro. Eles iam para uma casa abandonada para se encontrar com um homem que lhes mostraria os segredos do vampirismo.
Carlos pede atenção a Dalton e diz brevemente:
- Nada de falar da sua amiga Lecabel, entendeu Dalton?
- Mas eu preciso saber se ela realmente existe. Acho que se o cara que vamos conhecer é um vampiro, ele pode ver o que não vemos. Entende? Eu preciso saber.
Dalton, desde criança tinha visões com esta mulher. Lecabel, a mulher morena, cabelos lisos de 19 anos Ela sempre o perseguiu, em sonhos, em visões. Por vezes até ouvia as suas respostas monossilábicas. "Sim", "não" e hoje mesmo, quando ele estava saindo da sua casa, ouviu-a dizer "não". Mas ele queria saber mais sobre ela.
Estava apaixonado e faria de tudo para conhecê-la mesmo ela se negando a falar. O nome Lecabel foi um nome que ele escutou enquanto estava acordando pela manhã... ouviu três vezes. Nunca tinha escutado um nome tão diferente, mas mesmo assim, nunca mais esqueceu.
A casa não tinha luz, apenas velas colocadas em um único quarto. O homem de aproximadamente 40 anos estava lendo um livro muito antigo.
Ele os olhou com indiferença e falou com eles sem tirar a atenção do que estava lendo.
- Trouxe o que pedi?
Mauro, que era o mais medroso, disse:
- Está aqui senhor! O sangue que pediu.
Carlos deu a mochila para Mauro e dentro dela havia oito sacos de sangue.
Dalton disse impressionado:
- Onde conseguiu isso? Vocês roubaram sangue?
Carlos se defendeu:
- Vai por mim, Dalton! Vai valer a pena!
O homem pega a mochila... coloca o saco de sangue na frente da vela para ver a cor... Pega todos os sacos e os coloca em um frízer escondido debaixo da mesa. Olha para eles e fica imóvel por alguns segundos. Sem mostrar um sentimento qualquer ele diz:
- Perguntem!
Carlos é o primeiro a perguntar.
- Quanto tempo eu vou viver?
O homem olha para os lados e depois de algum tempo começa a andar pelo
quarto. Vai até um castiçal com três velas. Ele apaga duas velas. E
diz:
- Quando esta terceira vela apagar você morre.
- Carlos fica apavorado, mas ele vê o homem se afastar e deixar a vela acesa. Ele aponta para Mauro e diz:
- Sua vez!
Mauro pergunta rapidamente:
- Quanto tempo vou viver?
O homem sorri e diz...
- Então vocês querem saber mesmo o quanto viverão? Que interessante.
Mauro você não corre risco de vida. Viverá muito. Mas se quer algo
mais... se quiser uma vida eterna deve fazer um favor para mim.
Mauro engole seco, mas ele balança a cabeça favoravelmente e o homem
continua a falar:
- Bom Mauro. Para viver para sempre não é preciso fazer nenhum pacto,
nada que exija muita... Coragem. É só apagar aquela vela.
Carlos gritou:
- Não Mauro! Se você apagar aquela vela ele me mata!
- Desculpa Carlos, mas eu quero a vida eterna.
Dalton o impede:
- Você está louco? Este homem está brincando com a gente.
- Saia da minha frente, Dalton! Não quero nem você e nem a sua assombração Lecabel se metendo na minha vida!
- Esperem! O que foi que você disse?
Dalton respirou fundo e disse:
- Lecabel. É uma mulher...
- Eu sei quem é Lecabel! Onde ela está?
O homem furioso pega Dalton pelo colarinho e o levanta.
- Eu quero a Lecabel!!!
- Eu não sei... Ela aparece nos meus sonhos.
O homem joga o corpo do Dalton para o lado e começa a rir.
- Então ela agora tem um cargo diferente. – o homem continua rindo. –
Vamos ver como ela ira ajudá-lo agora, mortal. O homem abre a boca e os caninos pontiagudos aparecem.
Mauro grita...
- Senhor espere! E minha vida eterna? Como fica?
O vampiro arruma um pouco o seu cabelo e respira fundo para voltar ao seu controle e logo em seguida aponta para a vela e diz:
- É só apagar a vela!
Mauro corre até a vela... Ele sorri e apaga a vela. Neste momento uma lança sai debaixo da mesa e atravessa o corpo do Mauro. Ele fica pendurado ao lado da vela.
- Pronto! Pode ficar eternamente ai bem do lado vela.
Depois de muitas risadas ele fica sério e olha para o Carlos.
- Mas não é uma pena! O seu amigo o sacrificou!
Antes que o Carlos pudesse sair do quarto o seu corpo cai sem a cabeça. O Vampiro fica lambendo o sangue da cabeça de Carlos e joga a cabeça para o lado. Ao retomar à sua postura, ele olha diretamente para Dalton. Seus olhos estavam mostrando sinais de ira. O Vampiro começou a falar:
Há muito tempo eu fui preso e torturado por quatro anjos... Eu matei três deles. E advinha qual é o nome do quarto anjo que escapou?
- Le-Lecabel!
- Bingo!!!
O vampiro caminha até Dalton e continua falando:
- Lecabel! É o que chamamos de anjo guardião. Seu anjo! Mas eles só podem proteger mortais... Mortais!
Sua mão puxa os cabelos do Dalton para o lado deixando o pescoço a mostra... – Apenas Mortais!
O vampiro suga uma boa parte do sangue de Dalton. Logo depois faz um corte no seu próprio rosto e passa a boca do Dalton nele. Ele solta o corpo que cai no chão sem nenhuma reação.
- Lecabel! Está no contrato... Você só pode proteger mortais! Este homem agora é um Vampiro! E está é a minha vingança!
O vampiro se retira rindo!
24 horas depois.
- Eu quero voltar!
- Não Lecabel! Não há nada que possa fazer.
- Olha! Eu não sou um anjo comum... Sou guerreira. Ajudei a capturar muitos vampiros! Esse se vingou de mim. Transformou em vampiro o que eu protegia. Não pode terminar assim!
- Astard é um vampiro poderoso! Ele sabe que não podemos interferir.
Seu mortal foi irresponsável e ele pagou por isso! Caso encerrado!
- E se eu deixar de ser um anjo?
- Isso não é um clube Lecabel! O termo meio-anjo não existe!
Lecabel sai daquela sala toda azul e antes de fechar a porta diz:
- Existe amor depois da vida?
- Não tente fugir! Nós vamos caçá-la pela eternidade!
Dalton se levanta e sente uma leve dor no pescoço e uma enorme tonteira. Caminha pelo quarto. Sua boca estava seca e sentia dois dentes bem pontiagudos. Ele escuta uma voz.
- você esta em uma boa encrenca Dalton!
Dalton olha para aquela mulher... Ele a conhece... Já a viu nos sonhos. Só que agora ela usava uma jaqueta de couro e roupas escuras!
- Você é...
- Lecabel! Sim.. ainda sou um anjo mas agora serei caçada! Meus poderes são os mesmos mas.. agora todo mundo pode me ver. Hum... Você fica bem com estes novos olhos verdes!
Eles se abraçam. Isso não seria possível de nenhuma forma existente, mas agora o mundo que eles viviam não existe mais. Os dois vão
experimentar agora, uma nova vida, novos perigos surgirão mas também
conhecerão uma nova forma de... Amar.
"Lecabel é o anjo que rege o dia 12 de setembro" dia em que foi
inaugurado o teatro municipal!...
continua...
Aquilo que um dia fora a cabeça de Carlos não tinha mais carne ou pele. O processo de limpeza havia durado um ciclo de oito horas. Astard não conseguia lembrar quantos crânios tinha polido no curso de sua vida imortal até aperfeiçoar a técnica. Uma peça fresca como essa não se encontrava disponível no mercado. Agora era ir até o velho livro e encontrar os desenhos certos para a armadilha.
Parte da vantagem de ser um vampiro é ter tempo suficiente para descobrir exemplares raros de obras que muitos julgam inexistentes ou desaparecidas. Foi em uma de suas peregrinações que encontrou um antigo necromante, conhecedor de truques de aprisionamento. Ele não era do tipo que pode ser ameaçado, muito menos por um vampiro. Magos que estudam a vida e da morte sabem manipular a essência que está por trás do sangue dos imortais, o que realmente lhes tira a humanidade e joga de encontro à vida eterna. Por isso a força não era uma opção. Seres que permanecem vivos por magia não devem enfrentar magos, definitivamente.
O velho necromante olhou Astard com desdém. Conhecia seu nome, sabia que em sua casa jamais seria tocado e que poderia transformar a criatura em pó se assim o desejasse. Ciente da cobiça de colecionador do mago, o vampiro tratou de colocar as cartas na mesa. Tinha o cordão de um dos anjos que havia destruído no passado, peça de extremo poder e valor desconhecido. Aquele item sozinho já valeria uma boa quantidade de artefatos, mas Astard tinha um objetivo definido em mente. Em troca queria um dos livros de Amón, especificamente o que ensinava a aprisionar criaturas e divindades dentro de recipientes físicos. Na barganha, acabou deixando parte de seu sangue para estudos. Saiu fraco, mas satisfeito.
- Foi uma boa barganha, vampiro.
- Digo o mesmo, velho mago.
Astard aninhou-se no subterrâneo de sua casa, destrancou os armários e pegou o giz e a tinta. Hora de manifestar o lado artista não compreendido. Copiava o desenho com precisão, seguindo o que estava nas páginas empoeiradas do livro. Nos anos de estudo, tentara usar vasos de cerâmica, caixas de madeira e até mesmo lâmpadas metálicas, referência aos gênios míticos, mas esses materiais tinham durabilidade limitada e mais cedo ou mais tarde o espírito aprisionado conseguia fugir causando uma enorme confusão (espíritos aprisionados são muito vingativos, você deve imaginar). Por isso, voltara seus estudos aos ossos humanos, inescapáveis. Não por acaso, os frescos eram os melhores. Tinha se transformado em um bom manipulador, capturado elementais e espíritos errantes, mas seria a primeira vez que aplicaria a técnica em um anjo, então não podia se dar ao luxo de cometer erros.
Um desenho que tinha na base a forma de um pentagrama e no topo as curvas de um coração foi traçado no topo da caveira. Novas linhas surgiram, a caneta dançando sem parar, misturando símbolos de significados há muito tempo esquecidos. Astard deixou a caveira repousar sobre a mesa, a tinta adentrar o osso poroso. No chão, fez o círculo onde derramaria seu sangue. Mas antes, tinha que resolver uma pendência.
No andar de cima, pegou o cadáver espetado na lança e o carregou sobre os ombros de volta ao porão. A sujeira no caminho era desestimulante. Sempre ficava com a facilidade que os humanos tinham de inundar a casa de sangue só por causa de um furo ou dois. Mas dessa vez valeria a pena, já que estava mesmo precisando de um novo lacaio.
Depois de depositar o corpo de Mauro no centro dos desenhos traçados no chão, retirou-lhe toda a roupa do corpo. Tecidos incendiavam com facilidade em transições de estado de magia e ter que reconstruir o porão uma vez fora mais do que suficiente para entender o processo. Ajeitou-se sobre o corpo do jovem e mordeu ferozmente um pouco abaixo do peito. O sangue restante fluiu do boneco sem vida, parte para sua garganta, parte tingindo o chão. Com forças renovadas, pegou uma caixa de vidro com duas tíbias cruzadas e colocou em cima do peito do cadáver. O corpo era fresco, o espírito ainda não havia se desprendido. Iria fazer uma troca.
Dentro da cruz feita de tíbias havia aprisionado há cerca de dez anos um elemental do ar que resolvera rondar seus domínios. Com os anos de conversas e barganhas, sabia que um de seus desejos era sentir-se como um humano. Pois agora teria a chance.
Astard recitou a vigésima oitava página do livro de Amón. Sangue, espírito e oferenda. Uma luz forte envolveu o cadáver e a cruz. A luz se intensificou até se transformar em chamas. O cadáver se retorceu como se nele ainda houvesse vida. Feições humanas balançavam entre as chamas, enquanto o rombo feito pela lança se fechava. Astard acompanhou o espírito de Mauro vagar pelo fogo e ser aprisionado na cruz de ossos, ao mesmo tempo em que o elemental do ar entrava pela boca e pelas narinas do cadáver.
Astard caiu de joelhos. O processo consumira demais suas energias. Era a primeira vez que fazia um transporte duplo com direito a reanimação. Antes que fosse tarde, arrastou-se até o corpo que começava a despertar. Prendeu as mãos do golem com o peso dos joelhos e mordeu os próprios lábios, deixando o sangue pingar no rosto do que havia sido Mauro algumas horas atrás.
- Eu te batizo Arat. Não obedecerá a nenhum mestre que não tenha meu rosto nem minha voz. Não se voltará contra mim sem que a dor dilacere seu espírito. Você terá duas missões. Após cumprir as duas, estará livre para partir. Nesse meio tempo, poderá desfrutar todas as sensações do corpo humano e fazer dele o que quiser, contanto que não atrapalhe meus objetivos.
- De acordo, mestre.
Arat ergueu-se do chão experimentando o movimento dos dedos, tateando a pele, conhecendo-se diante da nudez. Uma leve brisa envolveu o ambiente e o corpo levitou no ar. O invólucro de carne não bloqueava os seus poderes como a cruz de ossos. Finalmente tinha um corpo para experimentar os prazeres humanos.
- Você vai precisar de roupas. Pegue no meu quarto o que melhor couber nesse corpo magrelo.
- E qual é a outra missão?
- Boa tentativa, mas isso não é uma missão, é um favor a nós dois para que você não vá preso ou chame atenção demais. A primeira missão será limpar a bagunça que está na sala. Limpe até que não haja sangue nos armários nem no chão. A segunda é encontrar um vampiro chamado Dalton e matá-lo. Lembre-se que está no corpo de um amigo dele, terá uma ótima chance de se aproximar para fazer o serviço.
Arat mirou fundo nos olhos de seu mestre, fez uma breve mesura e sorriu. Seu corpo ergueu-se mais uma vez no ar e desapareceu diante dos olhos do vampiro. Astard estava visivelmente assustado com a força do ser que havia criado, mas tinha uma vingança para se concentrar e não queria perder tempo.
Com a fraqueza inesperada, recorreu às bolsas de sangue que os estúpidos visitantes tinham trazido. Deleitou-se com cada saco, como se fosse uma peça refrescante e suculenta num dia de calor. A magia no ar era quase sufocante. Um humano comum certamente desmaiaria ao entrar na casa. O mais provável era que nem mesmo pequenos animais estivessem dispostos a se aproximar. Romper as fronteiras entre mundos sempre deixava a atmosfera mais densa. Era essa energia flutuante que pretendia usar para o golpe final.
Recuperado dentro do possível, o vampiro pegou o colocou o crânio dentro do heartagram e focalizou toda sua energia nele. Os subterrâneos da casa de Astard foram tomados de uma massa densa e escura, como se estivessem no meio do universo. O corpo do vampiro emanava uma luz violeta muito forte. Estava semitransparente. Era possível ver suas fibras, tendões, seus ossos. A dor era alucinante, mas necessária. Transformara-se em um canal entre dois mundos. Um ímã para a essência de sua inimiga.
Começou a senti-la em um ponto próximo. Tinha feito contato. Lecabel estava no mundo mortal. Tentava se afastar, mas era impossível. Astard repetiu a magia de Amón em seus pensamentos, uma vez atrás da outra. Não precisava de som nem de fala onde estava. Sentiu o anjo caído tocar sua mão, desorientado. Pegou-a pelo pulso, unindo-se ao ser celestial. Repetiu as palavras pela última vez e tocou o crânio com a palma da mão. Uma golfada de sangue batizou acidentalmente a prisão de ossos.
A energia se dissipou numa forte explosão, jogando Astard contra a parede. O mundo físico se fazia presente novamente, estava de volta ao seu porão. Buscando forças sabe-se lá em que lugar, colocou-se de pé e mirou o crânio de longe. Pequenos pontos vermelhos cintilaram no lugar das órbitas. Lecabel materializou-se ao lado de Astard, deixando-o atônito.
- Você deveria estar na prisão de ossos. – falou, tombando no centro do pentagrama.
- Seu vampiro estúpido. O que você fez? Eu estou presa ao seu corpo!
- O quê?
- Você me aprisionou dentro de você, idiota!
- Então... – Astard estava a ponto de desmaiar – Então o que é aquilo ali dentro?
Lecabel não esperou pela resposta. Fundiu-se novamente a Astard e o transportou dali, para um ponto fora da casa. O sol a pino fez o vampiro retroceder, num instinto primordial, mas para sua surpresa estava imune aos seus efeitos.
Lá embaixo, o crânio cintilou na escuridão. Ao seu redor, uma massa de energia e carne começava a se formar, criando contornos que lembravam um réptil. Astard havia cometido um erro que custaria muitas vidas. Ao abrir o portal para capturar Lecabel, tinha arrastado um demônio ancestral para o nosso mundo. Não podia imaginar que Lecabel já estava por aqui. Por ter abdicado de seu corpo celestial para ficar ao lado de Dalton, tinha saído da freqüência de energia que Astard considerava correta para encontrá-la.
Agora os dois inimigos precisariam agir juntos para derrotar uma criatura de força muito superior, enquanto Dalton conheceria um novo aliado, um golem com poderes bem curiosos. Arat começava a gostar do corpo de Mauro, de ser humano. Se não realizasse a segunda missão, poderia desfrutar dele o quanto quisesse.
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Eric Novello - http://www.ericnovello.com.br/
Adriano Siqueira - http://www.contosdevampiroseterror.blogspot.com/